domingo, 19 de julho de 2009

Ausente

Nada melhor do que o sentimento de 'oco'. Vazio completo e total. Ou aquela vontade de sumir do mapa por tempo indeterminado, sem dizer nada para ninguém, e ficar lá, com seus pensamentos, enfrentando seus dilemas e problemas. Mas no fundo eu sei que sou covarde demais para me enfrentar sem ninguém para me salvar.





A UM AUSENTE

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.
Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enloqueceu, enloquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?
Tenho razão para sentir saudades de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza de segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste.







(Carlos Drummond de Andrade)

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